Heloisa Cristaldo
Enviada Especial da Agência Brasil/EBC
Estudos do
Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe) com base em tendências
climáticas revelam que, em 2100, parte do Semiárido
brasileiro pode se tornar uma região de deserto. De acordo com o pesquisador do
Inpe José Marengo, o aumento da temperatura e a falta de chuva podem ser os
principais responsáveis pela aridez na região.“Em 2050, algumas partes do
Semiárido já podem passar a ser áridas. Atualmente
chove apenas parte do ano e a precipitação é mal distribuída. No caso da
aridez, é quando não há chuva”, explica. Para Marengo, a situação atual do
Semiárido é preocupante devido à duração da estiagem. A rigorosa escassez de
chuvas pelo segundo ano consecutivo impõe à região a pior seca dos últimos 50
anos, que atinge 1.046 municípios. “O maior problema é que a população ainda
não está adaptada à seca. E o fato não é um fenômeno surpresa, já aconteceu
antes.
Atualmente a população que sofre com os efeitos da estiagem, abandona
seus terrenos no campo e migra para as grandes cidades. Isso pode criar um
problema social, a pessoa desesperada por comida faz saques. Ela não quer roubar,
só quer comer. O impacto da seca já passou a ser um fenômeno social, político,
não apenas meteorológico”.
Os
efeitos mais agressivos da estiagem estão concentrados na Região Nordeste, onde
o Ministério do Meio Ambiente (MMA) já identificou oficialmente quatro núcleos
de desertificação: são 1.340 quilômetros quadrados e aproximadamente 1400
municípios em 11 estados. A área abrange 16% do território brasileiro.
Os
núcleos estão localizados na região do Seridó, na Paraíba, onde o fenômeno
ocorre devido à falta de manejo da caatinga para atender a pecuária extensiva e
a demanda energética; na região de Xingó, que compreende municípios nos estados
de Alagoas, Pernambuco, Sergipe e Bahia, a ocorrência se dá devido à irrigação
sem critérios técnicos, provocando a salinização dos solos; Na região de Gibões
(PI), ocorre uma intensa degradação do solo por processo de mineração
inadequado; e na região do Irauçuba (CE), por falta de manejo dos recursos
naturais.
De
acordo com o pesquisador em geoprocessamento da Embrapa Semiárido, Iêdo Sá, o
processo de desertificação é consequência de fatores humanos e climáticos. “O
Semiárido tem uma série de condicionantes como clima, solo, água e regime de
chuvas que é muito favorável a processos de degradação de ambiente. Associados
com práticas inadequadas adotadas pelo homem, às vezes por ignorância, por
má-fé ou falta de capital, [provocam a desertificação].
Dentre
os fatores humanos, ele destaca o desmatamento, a extração excessiva de
produtos florestais, as queimadas, a sobrecarga animal, o uso intensivo do solo
e seu manejo inadequado e, por último, o emprego de tecnologias não apropriadas
para ecossistemas frágeis. “Com respeito às causas climáticas da degradação, é
possível mencionar as recorrentes e prolongadas secas que afetam vários países
e que [agravam] ainda mais as consequências derivadas da ação humana”
Sá explica que nas áreas em
processo de desertificação as proporções de pobreza e de indigência estão acima
da média nacional. Segundo ele, no Nordeste brasileiro, uma área maior do que o
estado do Ceará já foi atingida pela desertificação de forma grave ou muito
grave.“Do mesmo modo, a pobreza e a indigência, geralmente, afetam a população
rural em maior proporção do que a população urbana, mesmo que, em números
absolutos, haja mais pobres nas cidades. É comum no meio rural que parte dos
membros do grupo familiar migrem, temporária ou permanentemente, em busca de
atividades de maior produtividade, seja na própria agricultura seja em outros
setores”.
Para
combater o processo, o MMA tem destinado em torno de R$ 25 milhões a
iniciativas de uso sustentável dos recursos naturais. De acordo com o diretor
do Departamento de Combate à Desertificação do ministério, Francisco Barreto
Campello, para viabilizar a aplicação dos recursos, a pasta viabilizou um
conjunto de projetos que promovem a convivência com a semiaridez para o combate
à desertificação, visando à segurança alimentar, energética, hídrica e da
biodiversidade.
O
processo de desertificação não se observa apenas no Semiárido brasileiro.
Segundo Campello, o fenômeno está presente em 34,7% da superfície do planeta,
em uma área onde vivem cerca de 41,3% da população. Na América Latina, dados da
Organização das Nações
Unidas para
a Alimentação e a Agricultura (FAO) revelam que mais de 516 milhões de
hectares são afetados no mundo. Como resultante do processo perdem-se cerca de
24 bilhões de toneladas por ano da camada arável e produtiva do solo, o que
afeta de forma negativa a produção agrícola e o desenvolvimento sustentável.
Sobre
os efeitos da longa estiagem provocada pelo clima semiárido, José Marengo
destacou a iniciativa de Israel como uma experiência de sucesso no convívio com
a falta de chuva. “Israel também tem seca, como a do Semiárido brasileiro, mas
não tem os mesmos problemas. Há produção [agrícola] o ano todo. Os
investimentos do setor privado são muito fortes. Lá eles aprenderam a conviver
com a seca. Um país pequeno, [com alto grau de tecnologia] – ideal para ser
aplicado no Brasil, como já é usado em Petrolina. Na cidade, há um investimento
forte com a agricultura”.
Segundo
o pesquisador do Inpe, a região de Sahel, na África também tem um clima
semelhante ao do Semiárido brasileiro. Dados da Organização das Nações Unidas
(ONU) mostram que a piora da situação da seca na região do Sahel já afeta 15
milhões de pessoas, incluindo um milhão de crianças, com a escassez de
alimentos e o agravamento da desnutrição. De acordo com o Conselho de Segurança
da ONU, a presença de grupos terroristas armados, junto com a pobreza crônica e
a alta dos preços dos alimentos, torna o problema ainda mais delicado na região
africana.
Edição: Tereza Barbosa
Fonte: Agencia Brasil
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